Do Tele.Síntese
A sociedade civil vem demonstrando descontentamento com a aprovação, dia 5, do PLC 110/2017, a reforma eleitoral. O texto recebeu uma emenda de última hora que determina a censura de conteúdos contrários aos interesses dos políticos publicados na internet.
O texto do PLC prevê a retirada do ar, em até 24 horas, por provedores de conteúdo, de qualquer publicação que tenha “ofensas em desfavor de partido, coligação, candidato ou de habilitado a candidatura”.
A emenda, de autoria do deputado Áureo (Solidariedade-RJ), obriga o provedor a retirar o conteúdo de aplicativos ou redes sociais até que identifique o autor das ofensas, mas diz que o provedor não poderá fornecer qualquer dado ao denunciante “salvo por ordem judicial”.
O presidente Michel Temer afirmou, por meio de comunicado emitido por sua secretaria de Comunicação, que vetará o artigo. Segundo Temer, o veto acontecerá em função de pedido feito pelo próprio autor da emenda que prevê a censura. “O presidente Michel Temer vetará o artigo da nova lei eleitoral, que exige aos provedores de aplicativos e redes sociais a suspensão de publicação quando for denunciada por ser falsa ou incitar ódio durante o pleito. O presidente atendeu pedido do Deputado Áureo (SD/RJ) após conversar, por telefone hoje de manhã, com o parlamentar”, diz o comunicado presidencial.
CGI.br
Associações de mídia criticaram duramente a iniciativa parlamentar. O Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) também apontou que o Marco Civil da Internet já trata dessas questões, com mais propriedade, o que torna desnecessária outra lei sobre o tema. O comitê destaca a “importância – para a internet no Brasil – da garantia da liberdade de expressão, da privacidade dos cidadãos e da preservação da funcionalidade, segurança e estabilidade da rede”.
O CGI.br esclareceu que “o Marco Civil da Internet, em seu art. 19, assegura a qualquer interessado a possibilidade de exigir judicialmente a remoção de conteúdos online de qualquer natureza, inclusive de conteúdos ofensivos, falsos, ou de ódio, estabelecendo expressamente que a remoção forçada desses conteúdos deve sempre ocorrer pela via judicial”.
Como a reforma eleitoral foi aprovada pelo Congresso, será encaminhada para sanção presidencial. O CGI.br pede que o presidente Michel Temer vete completamente a inclusão do artigo, que modifica o parágrafo 6º do artigo 57-B da Lei 9.504/1997.
O CGI defende que a Justiça Eleitoral tem vias rápidas para a análise e aprovação de pedidos judiciais para retirada de conteúdos falsos contra candidatos, “devendo sua competência institucional ser respeitada e prestigiada”. Acrescentar o item à Lei Eleitoral, na visão da organização, trará insegurança jurídica e comprometerá “o desenvolvimento da internet no país”.
Abranet
Também a Associação Brasileira de Internet (Abranet) criticou a emenda aprovada em Brasília. “A mudança, além de ferir a liberdade de expressão e informação, vai contra o Marco Civil da Internet”, afirma o presidente da Abranet, Eduardo Parajo. “Trata-se de uma afronta ao núcleo da democracia”, acrescenta.
O presidente da Abranet destaca que o Marco Civil garante que somente um magistrado pode julgar o que é considerado conteúdo ofensivo, falso, impróprio. “A sociedade não pode permitir que esta emenda seja sancionada pelo presidente Michel Temer, pois estaremos calando os princípios básicos da internet, que é justamente permitir a liberdade de expressão”, diz.
Coalizão Direitos na Rede
A Coalizão Direitos na Rede, que reúne dezenas de entidades que lutam pelos direitos digitais, iniciou uma campanha com a intenção de pressionar o presidente Temer a vetar o parágrafo aprovado pelo Congresso.
“A medida abre um perigoso precedente para a prática da censura e violação à privacidade, justo num momento fundamental de participação política dos cidadãos e cidadãs no futuro do país. Impor aos provedores que retirem conteúdos online por simples notificação, sob fundamentos com alto grau de subjetividade, antes do controle pelo Poder Judiciário, significa autorizar a censura privada arbitrária, em desrespeito à garantia do princípio do devido processo legal”, diz o grupo, em nota.
A interpretação da Coalizão é de que o texto aprovado ontem institui a suspensão do conteúdo como regra. “Na prática, impõe-se como requisito o uso do nome real online, constrangendo apenas pessoas reais de se manifestarem publicamente. Saindo pela culatras, desconsiderando que bots não precisam preservar dados pessoais, a medida abre mais espaço para a replicação automatizada de conteúdos, sobrecarregando indefinidamente a fiscalização de provedores”, observa.
Por fim, lembra que o texto aprovado pelos deputados e senadores soa como uma tentativa de se eximirem do controle social, garantido pela Constituição Federal. “A proposta, com suas graves e profundas consequências para os processos políticos e eleitorais no país, foi tratada na surdina, literalmente sem nenhum debate, seja diretamente com a sociedade, seja entre seus representantes eleitos para a Câmara dos Deputados e o Senado Federal”, conclui.
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