*Raphaelle Ferreira
À medida que a concorrência se intensificava e a demanda por conexões à Internet caía, provedores passaram a oferecer serviços adicionais a fim de valorizar sua oferta principal. Por um tempo, dispor, por exemplo, de streaming de vídeo constituía um diferencial mas, hoje, esse e outros chamados SVAs (Serviços de Valor Adicionado) se tornaram comuns nas prateleiras dos ISPs, tanto os destinados a empresas – e-mail, armazenamento em nuvem, VoIP etc. – quanto ao consumidor final – além do streaming, plataformas de EaD, Ebooks, dentre outros. A estratégia pode até funcionar para atrair clientes, porém, não têm resultado necessariamente em êxito como estratégia de fidelização. Quando usada para esse fim, não em poucos casos, resulta em problemas para as empresas.
Pela natureza de sua atividade, provedores de Internet são regulados pela Anatel. Esta não arbitra sobre SVA, definido em sua Resolução 190, como “atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações.”
A agência, porém, prevê, no artigo 64 da Resolução 632, que trata sobre direitos dos consumidores, que “a cobrança de qualquer valor devido que não decorra da prestação de serviços de telecomunicações depende de prévia e expressa autorização do Consumidor”.
Portanto, SVAs podem servir como instrumento que gera fidelização, desde que integrados a pacotes que incluam um SCM – o provimento de acesso à Internet. Porém, mal assessorados, provedores têm utilizado serviços de valor adicionado de forma isolada em suas ofertas o que, ao invés de garantir a presença do cliente na carteira por período mínimo determinado, acaba gerando queixas – que podem se tornar processos administrativos – ao PROCON e à própria Anatel.
A fidelização de um cliente se dá por meio da oferta de um benefício financeiro relacionado ao SCM. Por exemplo, ao invés de cobrar pela instalação, o ISP oferta gratuidade em troca de um contrato de doze meses. Ausentes na Resolução 632, SVAs não cumprem essa função se não forem atrelados aos pacotes de Internet.
Tributos
Outra prática comum entre PPPs é o uso dos SVAs para obtenção de abatimento tributário, o que pode ser interpretado como elisão fiscal, passível de penalidades e, também, na concessão não planejada de descontos aos clientes quando feito de forma inadequada.
Isso ocorre quando ISPs ofertam SVAs gratuitamente ou a preços irrisórios, buscando a compensação financeira na tributação. Diferentemente dos SCMs, os SVA não sofrem incidência do ICMS, principal imposto pago por provedores. Assim, mantendo o valor final acordado com o cliente, alteram o evento gerador do tributo, atribuindo parte da receita obtida com a oferta de conexão à Internet aos SVAs.
Como estes últimos aparecem depois nas faturas dos clientes com preços maiores que os acordados ou sem a gratuidade prometida, consumidores muitas vezes questionam as empresas, exigindo o cancelamento do serviço mediante manutenção do valor cobrado pelo acesso à Web após o abatimento do que se tentou atribuir a SVAs. Podem também recorrer ao PROCON onde, se não houver acordo, a queixa pode se tornar um processo administrativo e gerar multas que partem de R$ 866,00.
Caso o consumidor busque a Anatel, a empresa pode atrair para si a fiscalização da agência, que tem dado atenção especial à presença excessiva de SVAs no faturamento dos provedores. Em maio, a autarquia criou um grupo de trabalho para discutir o combate à prática de elisão fiscal e artificialidade tributária. Uma das ideias é direcionar seus atos fiscalizatórios preferencialmente a ISPs que declarem obter 40% ou mais de suas receitas com a oferta desses serviços. Nesses casos, são exigidos dos provedores balanços, declarações às secretarias da Fazenda, contratos de clientes etc., quando, não raramente, irregularidades são reveladas.
A oferta de SVAs compõe as estratégias de ISPs há anos. Para que cumpram as funções pretendidas sem gerar ônus futuros, sua formalização deve seguir as normas que regem a atividade dos provedores de Internet. Portanto, antes de levar um modelo de contrato ao cliente final, deve-se realizar uma análise, a fim de garantir que o documento é adequado para cumprir os objetivos comerciais em conformidade com a regulamentação vigente.
(*) Raphaelle Ferreira é advogada integrante da equipe jurídica da VianaCom, consultoria especializada na regularização de ISPs.
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