As redes compartilhadas e os provedores regionais


Fabio Vianna Coelho e Fabrício Viana/Crédito: Divulgação
Fabio Vianna Coelho e Fabrício Viana/Crédito: Divulgação

Fabio Vianna Coelho e Fabrício Viana(*)

A demanda gerada pela falta de interesse das grandes teles por áreas afastadas de regiões metropolitanas proporciona contínuo crescimento superior a 20% ao ano aos provedores regionais de Internet. Juntos, atendem a 39% dos usuários de banda larga do país, market share superior ao de qualquer operadora. Ainda que não se possa prever quando esta expansão perderá o ritmo, ao invés de um mercado que aceitava a todos, mesmo empresas mal geridas e até clandestinas, o segmento, a partir da atração de capital, passa a adotar profissionalização extrema. Paralelamente, o insucesso de uma das empresas surgidas a partir da privatização da Telebras leva grandes operadoras a disponibilizar suas infraestruturas. Juntos, estes movimentos podem mudar a configuração das telecomunicações no país.

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Diferente dos provedores regionais, a Oi, em vários momentos de sua história, foi “oficialmente” privilegiada. O primeiro deles, em sua criação, em 1998. Numa época em que as empresas atuavam apenas em suas áreas de concessão, a então Telemar Norte Leste dispunha, a partir da cisão do sistema Telebras, da maior cobertura – quase toda a costa e estados do Centro-oeste. Outro momento fundamental ocorreu em 2002, no primeiro mandato de Lula na Presidência, quando, como expoente nas telecomunicações da política de criação de gigantes nacionais, a chamada “supertele” recebeu diversos aportes.

Ao invés de êxito, surgiu um grande endividamento e, em 2016, a empresa entrou em recuperação judicial. A fim de reverter a situação financeira, a Oi – marca trazida da telefonia móvel – inicia, em 2021, o compartilhamento de sua infraestrutura. O modelo de negócios mostrou-se promissor a ponto de ser seguido pela Vivo.

O compartilhamento de redes já era prática usual entre os provedores regionais. Porém, como estas dispunham de alcance limitado – em geral, pequenos municípios –, concentrava-se na chamada “última milha”, segmento que chega à casa do usuário. Agora, porém, passam a ter acesso, a partir da das redes das teles, a todo o território nacional.

Por ora, é difícil dimensionar o market share que esses provedores poderão tomar das grandes operadoras em áreas metropolitanas. Mas é certo que imporão um grau maior de competição. Dispõem dos melhores índices de satisfação de clientes, algo que não se manterá, ao menos nos níveis atuais, com o crescimento de suas carteiras e exposição a falhas de redes, sejam a de seus concorrentes de maior porte, sejam as suas, que se expandiram consideravelmente nos últimos anos. Há, porém, indicadores claros de que eles poderão ser competitivos.

Nos últimos anos, houve um movimento intenso de profissionalização dos provedores regionais, o que se deveu, em grande medida, à política monetária. Após quedas sucessivas, a Selic chegou a seu menor nível histórico – 2% ao ano, entre agosto de 2020 e janeiro último –, o que, mesmo após as altas recentes, tornou negativo o rendimento real da renda fixa.

Isso levou à migração dos investidores para a economia real onde, em meio à crise, poucos setores performavam bem. Dentre esses, destacavam-se os provedores regionais, que tiveram o crescimento – já bastante significativo há anos – impulsionado pelo aumento do uso da Internet a partir da pandemia.

O investimento trouxe consigo conceitos de gestão, governança, compliance etc. necessários para a promoção de M&As, formação de fundos de investimentos compostos exclusivamente por provedores regionais e os IPOs de Desktop, Unifique e Brisanet.

Da mesma forma que as teles concentraram suas ofertas em grandes centros, os maiores provedores regionais privilegiaram municípios de médio porte. Continuarão a fazê-lo, mas, se tiverem capacidade, poderão atuar em capitais. Os demais também terão seu lugar no mercado, ofertando Serviços de Comunicação Multimídia (SCM) nas cidades menores.

Independente do porte, a sobrevivência dos provedores regionais estará condicionada a um novo nível de profissionalismo. Criados, geralmente, por empreendedores que com alta capacitação técnica, caracterizavam-se pela administração amadora. Carteiras geridas a partir de softwares genéricos – que não atendem às especificidades da prestação de SCM – ou mesmo gratuitos, geravam, a partir da primeira centena de clientes, confusão na oferta de pacotes contratados, passivos fiscais, descumprimento de obrigações regulatórias, dentre outros. O crescimento da concorrência elimina quem atua desta forma.

A atuação distante de grandes centros possibilitou a existência de grande número de empresas clandestinas. Ocorre que, da mesma forma que atraiu capital, o crescimento elevou a atenção do poder regulador. Até por reconhecer a importância dos provedores regionais para a expansão do número de acessos e na disseminação da banda larga na maior parte do território nacional – o que deve se repetir com o 5G –, a Anatel vem adotando medidas para o mapeamento da atuação dessas empresas.

Embora voltadas principalmente ao aumento da oferta, as ações da agência acabam por revelar quem atua à margem da lei. Caso notório foi o levantamento, divulgado em abril, realizado em parceria com a Abrint (Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações) de cidades que não possuem backhaul. Os dados da Anatel, resultantes dos relatórios encaminhados por provedores, apontavam 988 cidades enquanto, os da Abrint, 380. A discrepância resultava de empresas atuando com algum grau de irregularidade.

Ao terem acesso a redes que alcançam todo o país no momento em que atingem a maturidade administrativa, os provedores regionais possibilitarão um aumento crescente da competição nas telecomunicações. A qualidade da oferta e preço se estabelecerão sobre a disponibilidade de serviços como fator determinante na escolha do cliente. Aumentará o número de opções tanto do cliente final quanto de empresas de todos os segmentos, que terão acesso a fornecedores mais capazes de proporcionar a adoção de tecnologias imprescindíveis à competitividade nos dias atuais.


(*) Fabio Vianna Coelho, engenheiro eletricista, e Fabrício Viana, advogado, são sócios da VianaTel e da RadiusNet, empresas especializadas, respectivamente, em regularização e software de gestão para provedores.

 

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