Por que a tecnologia 5G no Brasil é de interesse da segurança nacional dos EUA?


Por Ericson Scorsim* 

Em entrevista à Folha de S. Paulo, em 11.06.2020, o Embaixador Todd Chapman dos Estados Unidos declarou que o financiamento da tecnologia 5G para o Brasil é de interesse da segurança nacional dos Estados Unidos. Conforme representante do governo norte-americano é de interesse dos Estados Unidos financiar a tecnologia de 5G, mediante o International Development Finance Corporation, para empresas aliadas aos interesses norte-americanos como é o caso da Ericsson (empresa privada originária da Suécia com atuação global) e Nokia (empresa privada originária da Finlândia com atuação global).  De fato, a legislação denominada Build Act (Better Utilization of Investments Leading to Development Act of 2018 (Build Act) autoriza o IDFC (International Development Finance Corporation) a financiar projetos no exterior, com recursos públicos norte-americanos.  

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Esta legislação é uma resposta direta à atuação da China sobre países emergentes. O objetivo da política externa dos EUA é estimular investimentos em 5G para empresas concorrentes da Huawei. Segundo o Embaixador norte-americano, a tecnologia de 5G da Huawei representa risco de acesso a dados e informações, eis que há ligação entre a empresa e o governo da China.  

Assim, a empresa é obrigada a compartilhar informações com os serviços de inteligência da China. E, ainda, segundo ele, o Departamento de Estados dos Unidos adotou um programa 5G Clean Path, o qual proíbe que as embaixadas norte-americanas adotem serviços de operadoras de telecomunicações que utilizem equipamentos de fornecedores de 5G de alto risco.[1]  

Segundo o Embaixador dificilmente alguém realizará investimentos em países aonde sua informação não seja protegida. Diante desta entrevista do Embaixador dos Estados Unidos, resta a dúvida: por que tanto interesse dos Estados Unidos na tecnologia de 5G no Brasil? Conforme declaração do Embaixador, há interesse de segurança nacional dos EUA no tema.  

Mas, ainda fica a dúvida: por que este interesse dos Estados Unidos? Os Estados Unidos estão preocupados com empresas norte-americanas que atuam em território brasileiro e, por acaso, venham a utilizar a tecnologia de 5G da Huawei? Ou, os Estados Unidos estão preocupados com empresas brasileiras que utilizem tecnologia de 5G da Huawei? Em artigo publicado no Portal Direito da Comunicação, expliquei esta questão da tecnologia de 5G e a disputa entre Estados Unidos e China.  

Em tese, há o risco de a empresa Huawei ser obrigada pela National Intelligence Law da China a compartilhar dados/informações com o serviço de inteligência nacional.  Mas, cabe esclarecer que este tipo de risco, também, pode existir em relação às empresas norte-americanas de telecomunicações, obrigadas a colaborar com as agências de inteligência de segurança nacional dos Estados Unidos, conforme determina a CALEA – Communications Assistance for Law Enforcement Act. Além disto, as empresas globais de tecnologia (Facebook, Twitter, Youtube, Microsoft, Amazon, entre outras), provedoras de aplicações de internet, também, em princípio podem ser obrigadas a colaborar com os serviços de inteligência e de segurança nacional, em casos de riscos à segurança nacional e segurança pública. 

Resumindo 

Em resumo, o atual governo dos Estados Unidos acusa a Huawei e a China de realizar espionagem eletrônica e acesso não autorizado a dados/informações, razão para a proibição de tecnologia de 5G da Huawei em território norte-americano. Mas, quem pode garantir que as agências governamentais dos Estados Unidos também não realizam estes tipos de espionagem eletrônica? Afinal, em 2013, é público e notório, que o Brasil foi alvo de espionagem realizada pela National Security Agency dos Estados Unidos, fato comprovado pela Comissão Parlamentar de Inquérito do Congresso Nacional. Além disto, a União Europeia e o Reino Unido apresentaram soluções para a mitigação dos riscos à segurança cibernética de tecnologia de fornecedor qualificado como de alto risco, impondo restrições parciais à Huawei.[2] Enfim, compete ao Brasil, como nação soberana, realizar a proteção das comunicações dos cidadãos, empresas e instituições brasileiras, diante de quaisquer riscos de espionagem eletrônica, seja proveniente dos Estados Unidos ou da China.  

Se o governo e o Congresso Nacional não reagirem à altura do desafio de proteção às infraestruturas de redes de comunicações, em tecnologia 5G, poderão responder por omissão à sua responsabilidade institucional. Alianças estratégicas internacionais são perigosas porque representam o risco de adesão incondicional e de modo acrítico à agenda prioritária do país mais forte na relação.  Daí os cuidados na formulação da política externa do Brasil em relação ao tema do 5G. E o alinhamento automático do Brasil a uma potência estrangeira tem o potencial de causar graves danos em suas relações internacionais.  Alinhamento automático pode ser o fruto de uma liderança colonizada; uma mentalidade de colono submisso ao colonizador. A política de segurança nacional do Brasil, em relação à tecnologia de 5G das redes de comunicações, não pode se submeter nem aos Estados Unidos nem à China. Uma política de submissão é atentatória à soberania nacional. Talvez, é chegada a hora de proclamar: Brazil First!


[1] Conforme Departamento do Estado dos EUA: “The 5G Clean Path is an end-to-end communication path that does not use any 5G transmission, control, computing, or storage equipment from an untrest vedor. A 5G Clean Path embodies the hightest standards of security against untrusted, high-rmisk vendor’s ability to disrupt or deny services to private citizens, financial institutions, or critical infrastrucuture”. 

[2] Ver: ScorsimEricsonA tecnologia competitiva de 5G da Huawei nas redes de telecomunicações de 5G: o alvo da geoestratégia da lawfare imposta pelos Estados Unidos contra Huawei e a China. Estudo completo do caso de repercussão sobre o Brasilwww.direitodacomunicacao.com


*Advogado e Consultor no Direito da Comunicação, nas áreas de Tecnologias, Internet, Mídias e Telecomunicações. Doutor em Direito pela USP. Autor da Coleção de Ebooks sobre Direito da Comunicação. 

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