Maria Clara Souza Baroni (*)
Resultado de incontáveis queixas de usuários de telefonia, ligações que configurem a prática de telemarketing ativo devem apresentar número de origem identificável sempre iniciado pelo prefixo 0303. Ao determinar a obrigatoriedade, a Anatel visa possibilitar às pessoas que não querem receber tais ligações recusá-las ou bloquear as linhas de origem. A questão que fica para os ISPs é até onde a medida os afeta.
A obrigatoriedade do uso do prefixo é prevista pelo Ato nº 10.413, aprovado pela Anatel em novembro de 2021. O documento determina que operadoras móveis teriam até 90 dias após a publicação da medida no Diário Oficial da União para adotarem o 0303. Desta forma, empresas que possuem a licença para SMP (Serviço Móvel Pessoal) tiveram até 10 de março último para se adequarem. Já as operadoras fixas tiveram um prazo mais dilatado – 90 dias – e estão sujeitas à determinação desde o dia 8 de junho.
A decisão, porém não se aplica apenas às operadoras de telefonia fixa e móvel. Prestadoras de serviço de telecomunicações que utilizam recursos de numeração organizados por meio de um conjunto de prefixos e códigos e que permitem o estabelecimento de conexões entre diferentes Terminações de Rede também ficam sujeitas à determinação.
Ainda que existam questionamentos quanto à abrangência do procedimento operacional, diante das medidas de controle da Anatel, verifica-se que todas as empresas com interesse em contatar potenciais consumidores para vendas precisarão se regularizar e usar prefixo 0303 com característica própria.
A Anatel deixou claro que sua intenção inicial era se concentrar sobre telefonia fixa e móvel, principais meios usados no telemarketing ativo. Porém, já prevendo que, com número significativo de usuário bloqueando números ou recusando essas chamadas, a atividade migrará para outros canais. Por isso, já se manifestou no sentido de que SMS, Whatsapp e outras ferramentas de comunicação que possam ser usadas para a oferta de produtos e serviços serão alvo de determinações semelhantes.
Isso já ocorre com o VoIP. Com base no entendimento de que não se trata de um serviço, a Anatel, recorrentemente, hesita em regulamentar o uso da tecnologia. Porém, por conta de seu uso para a realização de grandes volumes de ligações de até três segundos de duração, a agência tem autuado prestadoras exigindo, entre outros, que realizem o bloqueio de chamadas que não utilizem recursos de numeração por ela atribuídos e remetam-lhe listas de usuários que geraram 100 mil ou mais ligações diárias com as características mencionadas.
Mais do que os canais por que ele se dá, a intenção da agência é coibir o telemarketing ativo. O Ato nº 10.413 é a resposta da agência ao elevado número de queixas de pessoas que consideram a atividade – principalmente por conta dos excessos de quem as pratica – intrusiva.
Em sua definição, o telemarketing ativo refere-se às ligações realizadas com o intuito de ofertar serviços ou produtos, sejam através de ligações gravadas previamente ou não. A determinação da Anatel tem como alvo a atividade. Desta forma, não se aplica a ligações envolvendo cobranças, pedidos de doação e outros.
O assunto ainda gera discussões. Após a publicação do Ato nº 10.413, associações que representam empresas do setor de call center, como é o caso da Associação Brasileira de Telesserviços (ABT), recorreram ao Supremo Tribunal Federal (STF) solicitando o reconhecimento da inconstitucionalidade parcial da norma, a fim de fixar a interpretação no sentido de que a atribuição de uso de código não geográfico 303 é restrita à oferta por telefone de produtos e serviços por empresas prestadoras de serviços de telecomunicação.
Ainda que existam questionamentos quanto à abrangência do procedimento operacional, a prática de atividades de telemarketing ativo sem o uso do prefixo é considerada ilegal e poderá gerar sanções por parte da Anatel, como por exemplo, bloqueio do número indevidamente utilizado e aplicação de advertência ou multa, conforme estabelecem as normas internas do órgão.
Considerando o grande número de reclamações sobre telemarketing, a Anatel tem atuado há anos com o objetivo de acompanhar e controlar as práticas no segmento. É de se esperar, portanto, que a agência permaneça atuando com medidas de saneamento da questão de uso irregular das numerações, evitando o abuso de chamadas que não tenham objetivo de comunicação.
(*) Maria Clara Souza Baroni é advogada e integrante do departamento jurídico da VianaTel, empresa especializada em consultoria regulatória para provedores de Internet.
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