Por André Iizuka*
A disrupção tecnológica, os novos modelos de negócio, os ciclos curtos de inovação, o acesso cada vez mais fácil à informação e ao conhecimento, o baixo custo de novas tecnologias e a evolução socioeconômico têm gerado bem-estar social, facilidades e uma nova forma de viver que influencia desde a forma de estudar, trabalhar, assistir filmes, viajar, entre outras praticidades.
Segundo o estudo “Mercado Brasileiro de Software: Panorama e Tendências, 2022”, produzido pela Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES), atualmente 77,9% dos dispositivos no país são compostos por smartphones com avanço anual crescente de conexões de usuários corporativos e finais, licenciamento de software na nuvem, aplicações de conteúdo, inteligência artificial, internet das coisas, tecnologia 5G, e dispositivos vestíveis. Ademais, as Organizações Autônomas Descentralizadas (DAOs) têm utilizado blockchain em aplicações de criptoativos, tokenização de ativos materiais, pessoais e intangíveis, web 3.0, Defi, entre outras inovações.
Apesar de todos esses benefícios, diversos desafios surgem em decorrência da necessidade de segurança cibernética, jurídica e social, bem como a regulamentação da proteção dos direitos fundamentais, tais como da privacidade de dados, vida privada, propriedade, livre concorrência, economia popular, etc. E, nessa ordem, a regulamentação nem sempre acompanha a celeridade da inovação, criando lacunas e insegurança jurídica.
Paralelamente a isto, a legislação tributária brasileira, em seu ápice da ampla e sagaz complexidade, busca sempre ampliar o alcance da arrecadação mesmo que carente de legalidade e definição expressa da tipicidade tributária. E, mesmo que a norma expressamente impeça a cobrança, ainda assim as empresas de tecnologia de informação e comunicação (TIC) sofrem a incidência tributária por interpretações jurídicas destoantes da Constituição Federal, ou ainda, por desconhecimento técnico e tecnológico por parte dos membros do Poder Judiciário.
A Lei nº 10.168/2000 (Cide Remessas), destinada a financiar o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação, por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico — FNDCT, que passou por modificação pela Lei n° 11.452/07 (art. 1-A), prevê a não incidência da Cide sobre a “…remuneração pela licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de programa de computador, salvo quando envolverem a transferência da correspondente tecnologia.”
Apesar da norma definir expressamente a incidência apenas em caso de transferência de tecnologia, o Conselho de Administração de Recursos Fiscais (CARF) veio editar a Súmula nº 127, admitindo a incidência da Cide “na contratação de serviços técnicos prestados por residentes ou domiciliados no exterior” ainda que inexista “transferência de tecnologia“. Nesse diapasão, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao apreciar o Recurso Especial nº 1.642.249/SP (publicado no DJe em 23/10/2017), decidiu que a Cide-Remessas incide nos casos de fornecimento de tecnologia, ainda que não ocorra acesso ao código fonte, ou seja, sem a “absorção de tecnologia”.
Atualmente, tramita no STF o Recurso Extraordinário nº 928.942/SP (Tema 914), com o objetivo de garantir a não incidência da Cide sobre remessas ao exterior que não compreendam a transferência de tecnologia, como já garantido no art. 1°-A, da Lei nº 10.168/2000. Visando combater essa cobrança ilegal, a ABES criou o Projeto “FORA CIDE-REMESSAS” (Link), com o objetivo de engajar os associados e empresas do setor de software para aderir esse movimento visando garantir os direitos de não se sujeitarem a cobrança daquela contribuição.
Diante disso, é de suma importância nesse ambiente de rápidas mudanças e inovações haver maior interação com as empresas, os stakeholders internos e externos com a finalidade de prezar sempre pelo desenvolvimento social, a liberdade econômica e a livre iniciativa, de forma que a regulamentação e a imposição tributária deixem de ser uma barreira aos avanços da tecnologia.
* André Iizuka, membro do Conselho da ABES e Coordenador do Grupo de Trabalho de Tributação