As 360 páginas do projeto de lei complementar à reforma tributária enviado pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional na última semana ainda passa pela análise das empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), mas já despertou nas primeiras impressões a falta de algumas respostas. Representantes do setor compartilharam com o Tele.Síntese e Ponto ISP alguns itens que acreditavam ver solucionados nesta fase do debate, mas que ainda deixam dúvidas.
Cristiane Sanches, líder do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (Abrint), dividiu as principais preocupações em alguns tópicos. Um deles é o sistema de cashback – mecanismo de devolução de parte dos tributos pagos sobre o consumo –, que incluiu gastos com água, energia e gás, mas deixa comunicações de fora (única exceção dentre os mais recentes declarados serviços essenciais na Lei Complementar 194/2022).
“Essa seria uma possibilidade real de desonerar a cadeia e ter uma maior acessibilidade financeira nos planos, mas o cashback não foi pensado para serviços essenciais e esse é o grande problema”, afirmou Sanches.
Carga e simplificação
Outros pontos citados por Sanches envolvem qual será o real impacto na carga tributária e na simplificação, além da falta de detalhes sobre o funcionamento do Comitê Gestor do IBS – tema este que ficou para um segundo projeto de lei, previsto para maio.
A equipe econômica estima que a alíquota fique em torno de 26,5%. O momento mais crítico para os setores é a fase de transição, que vai de 1º de janeiro de 2027 a 31 de dezembro de 2032, quando os dois regimes – o atual (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) e o novo (IBS e CBS) – vão coexistir até a implementação completa em 2033.
O texto prevê uma trava para a alíquota de referência a ser formulada pelo Senado, com foco em manter a carga tributária atual.No entanto, estados e municípios poderão editar norma para para aumentar o valor da arrecadação pelo IBS.
“Estamos falando de uma alíquota média – leia-se também modal – de 26,5%, mais pelo menos 4% de tributos setoriais. Temos, sim, um aumento de carga tributária […] Deveria haver um tratamento diferenciado, com uma trava de carga tributária para considerar todos os tributos setoriais, mas isso não foi feito”, explica Sanches.
Quanto à simplificação, a conselheira da Abrint entende que ela “vai até um nível”, pois “não comporta a fase de transição da reforma”. Visão semelhante é compartilhada por Jorge Sukarie, membro do conselho da Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), sócio-fundador e presidente da Brasoftware.
“O que a gente vai ver é um aumento de complexidade num primeiro momento, porque nós vamos ter uma transição até 2032 e, nesse meio tempo, nós vamos estar recolhendo impostos em duplicidade, vamos ter que continuar adotando o nosso sistema atual complexo e vamos adicionar, supostamente, a simplicidade do novo sistema. Teremos um [sistema] complexo com algum multiplicador de dificuldade”, afirmou Sukarie.
Para o representante da Abes é preciso discutir segurança jurídica para os contribuintes nos primeiros anos, como um prazo de adaptação sem penalidades por eventuais erros cometidos, logicamente, sem deixar de considerar o pagamento pelo imposto corrigido.
Crédito
O mecanismo de creditamento é preocupação também compartilhada entre os representantes da Abrint e Abes.
Sanches destaca que “a não cumulatividade só é efetiva em uma reforma de IVA se ela for plena”. “Por exemplo, eu posso ter crédito de tudo, inclusive, de ICMS. Mas a lei pode estabelecer que o crédito só é apurável pela empresa que está prestando o serviço se a outra parte está pagando o imposto. Ou seja, não é um crédito pleno, não é uma não cumulatividade plena, porque depende do adimplemento do meu fornecedor na outra entidade, dentro da mesma cadeia de serviço. Isso não está tratado na reforma”, critica.
Sukarie manifestou receio quanto aos prazos previstos no PL. De acordo com o texto, a devolução terá um prazo padrão de 60 dias, mas pode levar até 270 dias caso o pedido demande análise do Comitê Gestor do IBS.
Debate
Apesar do ano legislativo ser interrompido em breve por uma eleição municipal, o presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) espera aprovar o projeto de lei complementar à reforma tributária ainda neste ano.
No sábado, 27, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que vai criar grupos de trabalho para debater a proposta encaminhada pelo governo. O cronograma, no entanto, ainda não foi definido.
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