O consorcio formado pela Claro, Oi e Telefônica para disputa do leilão de conexão das unidades dos Correios, em 2015, ensejou a redução da competição entre as três maiores operadoras do país no certame e prejudicou a atuação dos demais agentes de mercado. A conclusão é da relatora no processo administrativo aberto no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), conselheira Paula Azevedo. A votação da matéria, iniciada nesta quarta-feira, 9, à noite, foi suspensa por pedido de vista do presidente da autarquia, Alexandre Cordeiro Macedo.
O processo foi aberto após denúncia da Sencinet, atual nome da BT Brasil, que alega ter a participação no pregão cerceada por recusa de contratar e prática discriminatória de preço das teles, quando solicitadas para fornecer acesso local; oferta de preços superiores aos de outros participantes do mercado para acessos terrestres de mesma velocidade; e propostas de preços finais pelo consórcio formado pelas companhias aos Correios inferiores ao preço cobrado pela Representante BT para acesso a conexão terrestre. A relatora constatou a prática de atos anticompetitivas pelas empresas e recomendou multas no total de R$ 783 milhões, praticamente o mesmo valor obtido por elas na licitação.
Segundo Paula Azevedo, as operadoras não apresentaram justificativas econômicas válidas para a formação do consórcio, uma vez que cada uma poderia ter participado sozinha do certame. Que, na época, as três operadoras juntas detinham 95% da infraestrutura para promover o serviço e que o consórcio acabou por sobrepor redes, impedindo a participação de outras empresas na disputa.
A relatora acompanhou a nota técnica da Superintendência-Geral do Cade nas conclusões sobre as condutas concertadas, que afastaram concorrentes, e nas condutas unilaterais, de recusa de contratar e discriminação de preços. Segundo ela, a justificativa da Claro da necessidade de complementariedade de rede para a formação do consórcio não é válida já que a empresa detinha meios de atendimento de 90% das conexões solicitadas. Além disso, ressalta que a operadora dividia a posição de Poder de Mercado Significativo com as outras duas em todo o país.
O argumento da Oi, de que não tinha rede em São Paulo, também foi descartado, já que a rede da operadora só não estava presente em 69 dos 645 municípios do estado. Também não progrediu a desculpa da impossibilidade de atendimento a municípios de difícil acesso, uma vez que por ato da Anatel se verificava que a operadora era PMS em 85% dessas cidades.
Paula Azevedo afirma que a desculpa da Telefônica, de não ter rede fora de São Paulo, poderia até ser razoável, mas, mesmo assim, em associação com uma das duas outras ou mesmo subcontratando infraestrutura teria condições muito mais favoráveis de competir do que outras concorrentes.
Multas
Para a relatora, as práticas adotadas pelas operadoras se assemelham a de um cartel difuso, porém esse tipo de associação é permitido pela legislação brasileira de licitação. Mas essa conclusão serviu para se chegar a uma dosimetria das penas, adequada a extensão do prejuízo causado pelo consórcio à competição.
No seu parecer, Paula afirma que desistiu de aplicar a pena prevista para esse tipo de infração, de no mínimo 5% do faturamento no ramo da atividade em um ano. “Esse cálculo levaria a multas desproporcionais e, por essa razão, decidi pela multiplicação por quatro vezes a vantagem auferida com a licitação por cada operadora”, disse.
Por essa metodologia, a Claro seria multada em R$ 395,2 milhões; a Oi, em R$ 266,1 milhões e a Telefônica, em R$ 121,7 milhões. Caso seja aprovado o parecer, as operadoras terão o prazo de 30 dias para o pagamento sob pena de multas diárias no valor de R$ 100 mil.
MPF
A relatora ainda acompanhou a recomendação do representante do Ministério Público Federal junto ao Cade, Waldir Alves, que também condenou as práticas anticompetitivas das empresas. Ele pediu que o governo brasileiro adote as recomendações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que publicou um importante relatório acerca das regras e práticas de compras públicas federais brasileiras
“O relatório evidencia que, embora o regime de compras públicas federais do Brasil reconhece e tenta limitar os riscos de conluios em licitações, esforços adicionais para tornar as compras federais mais competitivas devem ser úteis, e o relatório propõe formas de atingir esse objetivo”, disse. O levantamento apurou que somente em 2020 o Brasil gastou cerca de R$ 35,5 bilhões em bens, serviços e obras. Em 2017 as compras públicas representaram cerca de 13,5% dos gastos totais do governo brasileiro, e aproximadamente 6,5% do PIB do país. “Ou seja, as compras públicas desempenham um papel estratégico na economia e na qualidade dos serviços que o governo fornece aos seus cidadãos”, afirmou.
Entre as diretrizes, citou a obrigação de estar vigilante quanto à natureza competitiva ou anticompetitiva de licitações e subcontratações conjuntas. “O Cade deve se engajar em iniciativas de conscientização para informar os agentes de compras públicas sobre os efeitos que as licitações e subcontratações conjuntas podem ter sobre as condições competitivas das licitações”, diz o relatório.
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